sexta-feira, 25 de junho de 2010

A DOUTRINA DA GRAÇA NA VIDA PRÁTICA: ORIENTAÇÃO

por Terry Johnson

Por favor, leia o Salmo 23

Com quem vou me casar? Onde vou viver? Onde vou trabalhar? Estas são as três grandes questões da vida. Há dezenas de outras menos importantes que também pesam muito sobre nós. Onde vou estudar? Devo comprar este carro? Faço essa viagem? Algumas vezes pode ser muito difícil responder a essas questões. Minha decisão de ser o pastor dos jovens na Igreja Presbiteriana de Granada em vez de professor de Bíblia em uma escola cristã, em Macon, em junho de 1982, tomou várias semanas de debate interno e oração confusa. Dia após dia, eu gritava por dentro: “O que eu faço?” Muitos de vocês já estiveram nessa situação. Outros sempre estão assim. Não sabemos exatamente o que fazer.

A questão que devemos tratar aqui é se Deus vai nos ajudar ou não em nossas decisões. Para isso, mais do que em qualquer outro assunto, devemos adotar um entendimento evangélico de Deus e do nosso relacionamento com ele. Devemos reconhecer que Deus é um ser pessoal que ama seu povo em Jesus Cristo e que promete guiar seu povo como um Pai e como um Pastor. Devemos admitir ser verdade que:

Ele me faz repousar em pastos verdejantes. Leva-me para junto das águas de descanso; refrigera-me a alma. Guia-me pelas veredas da justiça por amor do seu nome (Sl 23.2,3).

E novamente o salmista Davi diz:

Bom e reto é o Senhor, por isso, aponta o caminho aos pecadores. Guia os humildes na justiça e ensina aos mansos o seu caminho. … Ao homem que teme ao Senhor, ele o instruirá no caminho que deve escolher (Sl 25.8,9,12).

Parece bastante claro que Deus nos leva, guia e instrui no caminho que devíamos escolher: A discussão que ocorre nos círculos evangélicos é sobre como Deus guia seu povo. Como ele torna sua vontade conhecida? Como ele comunica o melhor caminho a seguir? Há dois extremos a serem evitados. O primeiro é o excesso do superespiritual. Disposições interiores, providências extraordinárias, sonhos e vozes separadas da Palavra tornam-se infalivelmente cheias de autoridade. Muita bobagem tem sido feita em anos recentes em nome do que “Deus me disse para fazer” por um desses meios. O outro extremo a evitar-se é aquele de reduzir a orientação a nada mais do que a aplicação de princípios bíblicos. A Bíblia, nesse conceito, torna-se um manual para a vida que virtualmente dispensa ajuda sobrenatural. Essa posição tende para o Deísmo, um conceito que elimina qualquer interação pessoal ou comunicação significativa entre Deus e seu povo.

Em algum lugar entre estas duas posições encontra-se o equilíbrio bíblico. Deus guia seu povo. Ele faz isso por meio de seu Espírito. Mas o Espírito faz seu trabalho por meio de princípios sadios e, como veremos, através da interpretação de nossas circunstâncias.

A Iluminação do Espírito

A tradição reformada nega firmemente que Deus dê a seu povo alguma nova revelação, “tendo cessado aqueles antigos modos de Deus revelar a sua vontade a seu povo” (Confissão de Fé de Westminster, I.I). Mesmo aqueles que não concordam com isso são obrigados a concordar que Deus geralmente não guia seu povo falando-lhe audível ou diretamente. Ele não fez isso nos tempos bíblicos, e não o faz agora. O agricultor hebreu comum que buscasse a orientação de Deus quanto ao que plantar, trigo ou cevada, não recebia a resposta diretamente. Ele orava pela sabedoria necessária para tomar a decisão , e lhe era dada. Do mesmo modo, mesmo aqueles que crêem em profecia progressiva e em revelação por sonhos, são obrigados a concordar que este tipo de orientação é igualmente a rara exceção hoje. A maior parte de nossa orientação, a variedade diária para pessoas comuns, é muito mundana, até mesmo para o carismaticamente inclinado.

Todavia, o papel sobrenatural do Espírito Santo é mais vital ainda. Devemos ter o Espírito Santo se quisermos evitar cálculos errados e passos em falso. Contudo, sua obra, desde a conclusão do cânon da Escritura, deveria ser entendida como a de iluminação e não de inspiração . O Espírito Santo é a chave para orientar, mas ele não nos orienta dando novas informações (como em “fazer isso ou aquilo”), e sim iluminando a Palavra dada e nossas circunstâncias , mostrando-nos o caminho da sabedoria. Ele nos dá uma paz segura e convicção certa, garantindo-nos que estamos nos movendo numa direção consistente. Ele ilumina todos os fatores diante de nós, de modo que somos capazes de escolher aquilo que é sábio e bom.

Como ele faz isso? Já demos algumas sugestões. Para uma resposta mais completa avancemos para a próxima seção.

Princípios Evangélicos de Orientação

Vamos considerar como o Espírito faz esta obra. Respostas seguras podem ser encontradas revendo o ensino evangélico padrão sobre orientação.

Em primeiro lugar, Deus nos orienta através da Escritura. Isso é verdade tanto no sentido específico (a) proibindo certas opções e prescrevendo outras, quanto no sentido mais geral (b) dando forma aos desejos, pontos de vista e a perspectiva do filho de Deus. Por exemplo, se eu estivesse procurando casar-me, a Escritura me diria para não me casar com uma mulher não-cristã, como no item ‘a' . Mas, também daria forma a meu conceito sobre o que o casamento é, por que o casamento é uma “condição respeitável” , e sobre as qualidades a observar em uma esposa, como no item ‘b' . Deste modo, um homem solteiro piedoso procurará uma esposa cristã tanto porque isso é o que a Escritura requer, como porque a Escritura deu forma a seus desejos, de modo que é isso que ele deseja também, deseja até mesmo ardentemente. Se eu fosse procurar um emprego, a Escritura não me diria para procurar um emprego como um traficante ou gangster (bandido), como no item ‘a' , mas ela também me falaria sobre a dignidade do trabalho e para procurar um trabalho que maximiza meus dons, ao mesmo tempo em que sirvo a igreja e a sociedade, como no item ‘b' .

No sentido prescritivo e restritivo, lemos:

De que maneira poderá o jovem guardar puro o seu caminho? Observando-o segundo a tua palavra… Guardo no coração as tuas palavras, para não pecar contra ti (Sl 119.9,11).

No sentido de dar forma, lemos:

Lâmpada para os meus pés é a tua palavra, e luz para os meus caminhos (Sl 119.105).

Paulo pôde dizer que,

Toda Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça, a fim de que o homem de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa obra (2Tm 3.16,17).

A Palavra de Deus nos equipa “para toda boa obra” limitando nossas opções e dando forma a nossos interesses. Ela nos ensina em um sentido positivo, informando-nos sobre a verdade e treinando-nos na justiça. Ela também nos reprova, corrigindo erros e mostrando-nos onde erramos o alvo.

A Bíblia é o primeiro meio pelo qual Deus guia seu povo. Mais do que qualquer outro fator, ela determina o tipo de vida que devemos levar. Milhares de opções são literalmente eliminadas pela influência da Bíblia sobre nós. Nada que é ilegal, imoral, egoísta ou sem amor, pode ser considerado. Mas novamente, é importante compreender que ela faz isso não apenas por meio de regras específicas (nosso item ‘a' ), mas também dando-nos a “mente de Cristo” (1Co 2.16, nosso item ‘b' ). Pela constante leitura, estudo e meditação na Palavra de Deus, começamos a “pensar os pensamentos de Deus após ele” , para usar a frase de Calvino. Assim, estar “cheio do Espírito” é “deixar a Palavra de Cristo habitar ricamente em você ” (compare Ef 5.18,19 com Cl 3.16). Ser “guiado pelo Espírito de Deus” deve especificamente fazer morrer a carne e andar no Espírito (Rm 8.12-14).

A Bíblia nos ensina a olhar para a vida e suas opções como Deus olharia para ela. Quando digerimos interiormente a Palavra de Deus, torna-se quase instintivo para nós, responder ao mundo da perspectiva que Deus tem, com base nos valores e prioridades divinas. Muitos que combatem com firmeza não vêem necessidade de olhar para nada além disso. Mais de uma vez eu tenho ouvido de pessoas com grande angústia de alma, quando elas não têm fundamentos sancionados biblicamente, debatendo-se com a dúvida se procuram ou não um divórcio. Elas perguntam: “O que Deus quer fazer comigo?” Não há mistério em responder nestas circunstâncias. Fique quieto! A chave para as dificuldades de muitos é a ignorância da mente de Cristo como revelada em sua Palavra e iluminada pelo Espírito. A chave para seu alívio é o conhecimento .

Em segundo lugar, Deus orienta-nos através da oração . Você está tendo dificuldade para tomar uma decisão? Você tem orado pedindo orientação? Você não tem porque não pedir, diz Tiago:
Se, porém, algum de vós necessita de sabedoria, peça-a a Deus, que a todos dá liberalmente e nada lhes impropera; e ser-lhe-á concedida (Tg 1.5).

Freqüentemente, na vida de Jesus, as principais decisões foram precedidas de oração (Lc 3.21; 5.16; 6.12; 9.18; 9.28,29; 11.2 e seguintes, etc.). Como foi verdadeiro na Escritura, podemos pensar sobre o papel da oração na orientação tanto num sentido geral quanto específico. Uma pessoa deveria orar a respeito de uma decisão particular, para que faça a coisa certa e que glorifique a Deus. Mas há também a realidade mais geral que está no contexto da oração, para que Deus nos dê respostas. Pode até mesmo ser que estejamos orando acerca de “y” quando vem uma clara resposta concernente a “x”. Muitas, e muitas vezes eu quero elaborar um esboço para meu sermão durante minhas devocionais matutinas, quando estou lendo uma passagem da Escritura não relacionada, ou orando sobre alguma outra coisa. Da mesma forma, freqüentemente tenho recebido claras e fortes convicções acerca de um ministério em nossa igreja – que devemos fazer isso ou parar de fazer aquilo. De fato, cada nova idéia sobre meu ministério pastoral tem ocorrido durante minhas orações matinais. Por que esta seria a tendência? Porque, quando pedimos, Deus ouve (e responde) e nós ouvimos . Quando oramos, (finalmente) diminuímos nosso ritmo e escutamos. Quando oramos, não estamos enchendo nossas mentes com notícias, música, conversas, entretenimentos, e deste modo temos uma oportunidade de ouvir Deus. Quantos casamentos são uma confusão porque esposos e esposas não estão parando para orar e escutar? Quantas escolhas vocacionais têm sido feitas tolamente porque as pessoas não têm sido humildes na oração e pacientemente esperado e escutado? Lembre-se, não menospreze a insensatez do coração humano ou a estupidez do cérebro humano. Somos lentos e propensos ao erro. Necessitamos da sabedoria de Deus se queremos viver sabiamente. Para obtê-la devemos pedir.

Em terceiro lugar, Deus nos orienta por meio de conselhos piedosos. Cada passo do caminho no processo de tomar decisões deveria incluir a advertência e o conselho do sábio. Muitas vezes, nossas fortes convicções são incompletas. Realmente não temos pensado em tudo completamente. Existem pontos cegos em nossa visão das coisas. Não temos considerado todos os fatores. Porque uma perspectiva empenada (torcida) é inevitável, é necessário que busquemos o conselho de outros. Sozinhos, somos fracos. “Mas na multidão de conselheiros há segurança” (Pv 11.14). A solidão conduz a presunção. “Mas com os que se aconselham se acha a sabedoria” (Pv 13.10).
O caminho do insensato aos seus próprios olhos parece reto, mas o sábio dá ouvidos aos conselhos (Pv 12.15).
Ouve o conselho e recebe a instrução, para que sejas sábio nos teus dias por vir (Pv 19.20).
Onde não há conselho fracassam os projetos, mas com os muitos conselheiros há bom êxito (Pv 15.22; cf. 20.18; 24.6).

A autoridade na igreja não deve ser dada a um único indivíduo. O governo deve ser coletivo e o poder distribuído. Mudanças no status quo devem vir somente através da deliberação coletiva. Sobre uma base regular em comissões e concílios a sabedoria será encontrada na “multidão de conselheiros” quando propostas são corrigidas, alteradas, melhoradas e, finalmente, rejeitadas ou aprovadas por meio da sabedoria coletiva dessas assembléias.

Uma outra área onde este princípio é bem ilustrado é na chamada para o ministério. É preciso fazer uma distinção entre as chamadas “interna” e “externa”. A primeira é a convicção de uma pessoa de que ela tem sido dotada e chamada para pregar. Mas essa chamada nunca é considerada como suficiente sozinha. A chamada “interna” deve ser confirmada pela última, a chamada “externa”, feita por meio da igreja. A igreja coletivamente avalia o sentido da chamada que um candidato tem e a confirma ou a rejeita. Isso serve para prevenir decisões não sábias que estão destinadas a frustrar e magoar o não dotado. Pesarosamente, nos últimos anos temos visto muitos jovens irem para o seminário, gastam três ou quatro anos e muito dinheiro sendo treinados, são ordenados e servem por vários anos na igreja, e então compreendem que não têm os dons. Abatidos, devastados financeira e emocionalmente, e, pior, algumas vezes profundamente cínicos acerca das coisas de Deus, eles abandonam o ministério. Conhecendo a insensatez e a falsidade de seu próprio coração (Jr 17.9), o homem sábio exigirá confirmação.

Estes são os princípios de orientação geralmente aceitos nas igrejas evangélicas. Estas são as coisas que o Espírito Santo usa para orientar seu povo. Nós as afirmaremos e, de certa forma, até as sublinharemos se tivermos uma mais profunda doutrina do pecado. Devemos ter a orientação de Deus em nossa tomada de decisão por causa de nossa capacidade para o erro. Esta orientação não é dada pelo Espírito Santo por meio de impulsos, vozes ou sonhos - todas estas coisas são muito subjetivas para corações inclinados ao pecado –, mas através do critério objetivo da Escritura, da oração e do conselho piedoso.

Os Suplementos

Embora os princípios acima sejam vitais, eles não vão longe o suficiente. Eles sentem falta da informação crítica que se alcança com a compreensão sobre a soberania de Deus. Podemos resumir esta doutrina com uma frase. Deus fez você o que você é. Através da criação, da redenção e da providência, Deus tem feito o que você é. Não tem havido acidentes; ele é o autor de todos os fatores. Porque ele é, podemos admitir que todas estas coisas trabalham juntas indicando o tipo de vida que Deus tem ordenado que eu deveria viver. No entendimento do que Deus tem feito conosco, pode ser encontrado profundo discernimento do que Deus quer para nós .

Deixe-me dar um exemplo. Quando Paulo foi chamado para ser um apóstolo? Na estrada de Damasco, quando Jesus apareceu a ele numa luz ofuscante? Num sentido, sim. Isso foi quando a chamada em si foi recebida. Mas, ele diz aos gálatas que Deus o tinha separado “antes de eu nascer” (Gl 1.15). Sim, ele foi chamado “pela sua graça” na estrada de Damasco. Mas Paulo pode recordar toda sua vida e ver a mão de Deus trabalhando. Deus o estava preparando para o trabalho de evangelização aos gentios enquanto ele ainda estava no ventre, depois em todo seu desenvolvimento, antes da sua conversão até a experiência na estrada de Damasco.

Tenho conhecido pessoas que foram convertidas quando adultos, que desprezam seus dons naturais e formação familiar recusando-se a fazer uso dessas coisas. Até onde os dons naturais e a formação familiar relacionam-se com a salvação? Paulo os considera como refugo (Fp 3.4-8). Mas ele nasceu com cidadania romana e, quando capturado, ele a usou (At 16.35-40; 25.11). Ele foi educado como um fariseu, e quando colocado contra a parede identificou-se com eles, defendendo-se como “fariseu, um filho de fariseus” (At 23.6). Ele recebeu a primeira porção de educação de Gamaliel e da Universidade de Tarsis, e é óbvio seu uso disto, através de seus escritos. Assim, quando ele se recorda de toda sua vida, ele vê o Deus soberano preparando-o para seu trabalho a cada passo do caminho. Todos os fatores foram ordenados por Deus para equipá-lo para a tarefa de levar o evangelho aos gentios, o primeiro grupo dos quais eram judeus que freqüentavam as sinagogas. Ele entendia o pensamento da seita mais rigorosa do Judaísmo e seus mais veementes oponentes, os fariseus, e mais tarde, os judaizantes. Por quê? Porque Deus tinha ordenado que ele deveria nascer numa família de fariseus. Ele conhecia o mundo judeu. Mas ele também nasceu numa família de fariseus, vivendo numa cidade gentílica, Tarsis. Assim, ele conhecia o mundo gentílico também. Ele podia falar e escrever a língua grega; tinha freqüentado suas escolas. Ele conhecia seu pensamento. Ele leu seus poetas (At 17.1 e seg.). Quando salvo, foram então adicionados dons espirituais em cima dos naturais. A criação, a providência e a redenção estavam em harmonia uma com a outra.

Como você aplica estes princípios? Estas são as perguntas que eu faria a alguém que está procurando a orientação de Deus. Quem fez você? Deus? Bem, então, o que ele tem feito você ser? Quais são seus dons naturais? Quais são seus interesses naturais? Por que Deus teria dado a você esses dons e interesses, a não ser que ele planejasse que você usasse, até mesmo os desenvolvesse? Não é honra ao Criador quando aquilo que ele cria, funciona com sua plena capacidade?

Então, eu faria uma segunda série de perguntas. Que oportunidades você tem tido? Quem as tem dado? Deus não é soberano sobre suas oportunidades e falta de oportunidades?

Deixe-me ilustrar com minha própria vida. Eu gosto de ler e estudar História; eu sempre gostei. De onde vem este desejo? Eu creio que ele é parte do que eu sou, de como fui criado. Algumas pessoas gostam de Mecânica, alguns de livros. Eu, de História. Porque é inato, não há explicação, exceto que Deus concedeu. Mas então, houve fatores encorajadores ao longo do caminho. Meu pai gostava de história de guerra e me expôs a uma grande quantidade dela. Meu professor do quinto grau, o velho Sr. Beacon, reconheceu meu interesse e jeito para História, e me estimulou. Quem ordenou e determinou estes fatores? O Deus da providência. Então, quando eu despertei espiritualmente, deveria ter esperado que o Deus da redenção conduzisse numa direção completamente contrária àquela que ele tinha desenvolvido todos aqueles anos? Ou haveria continuidade e convergência entre criação, providência e redenção? A menos que o Criador, o Governador e o Redentor sejam três deuses diferentes, cada um com programas diferentes, devíamos esperar harmonia. Eu penso que sempre soube que minha vocação envolveria o estudo de História. Quando comecei a discernir a chamada para o ministério, percebi que a chamada veio a alguém que já tinha descoberto que uma grande parte da interpretação bíblica está no entendimento da história, tanto o contexto histórico no qual a Escritura foi escrita, como a história da interpretação das várias passagens. A primeira vez que sentei para preparar um estudo da Bíblia, e ensiná-lo, tive a certeza de que estava fazendo o que de fato fui criado para fazer. Havia um senso de dever. Isso caiu bem. Toda minha vida tinha me preparado para aquele momento e para a tarefa do ministério do ensino.

Você pode me dizer as mesmas coisas sobre você. Você tem interesses e habilidades naturais. Houve oportunidades ao longo do caminho que alimentaram e desenvolveram esses interesses e habilidades. Quando você decide escolher uma matéria no colégio, seguir uma carreira, e depois um lugar para viver, estes fatores, todos determinados pelo Deus da criação, da providência e da redenção, não desempenharão um papel vital? Os dons e a chamada de Deus caminham de mãos dadas. O que ele fez você ser? Quais são seus interesses? Quais suas habilidades? Quais são suas oportunidades? Fazemos estas perguntas supondo que você já está aplicando os princípios evangélicos acima descritos. Você está na Palavra de Deus, orando e buscando conselhos piedosos. Mas visto que você está fazendo isso, pergunte-se o que seu Criador e Governador, seu pai e amigo, fez você ser? Você é bom com números? Prossiga então. Você é dotado em música? Desenvolva-o. Um bom organizador e realizador? Procure por trabalho administrativo. Sente que deve ensinar e pregar? Exercite seus dons.

Temos considerado principalmente vocações materiais, mas os mesmos princípios aplicam-se a todas as coisas. Quais são seus interesses? Quais são suas oportunidades? Ambas as vezes que selecionei seminários para freqüentar, a decisão foi longa e dolorosa, mas finalmente clara. Um californiano tolo, superficial, precisava sair dos Estados Unidos e estudar com um homem da qualidade e caráter de J.I. Packer. Isso “caiu bem”. Havia um senso de dever. O mesmo foi verdade quanto ao meu retorno aos Estados Unidos, para o Seminário Gordon-Conwell. Havia uma convergência de fatores que um dia deixaram-me – eu me lembro do momento – convencido que eu devia ir. Vir para minha igreja atual foi uma experiência semelhante. Eu gosto de História – aqui é uma igreja histórica. Eu creio na pregação – aqui está um púlpito alto. Eu creio na adoração tradicional, reverente, isso é o que eles procuravam. Eu adoro a Escócia – aqui está uma herança escocesa. Eu tinha sonhado em servir uma igreja central. Isso se adapta bem. Pareceu correto.

Examine por um momento a questão do casamento. Como sabia que não devia casar-me com alguém do norte da Alemanha? Porque o Governador do mundo nunca me deu uma oportunidade para fazer isso. Se ele tinha a intenção de casar-me com uma mulher do norte da Alemanha, ele o teria arranjado. Em vez disso, antes ele colocou a jovem Emily inequivocamente em minha vida. A seguir ele me deu um grande amor por ela. Aqui está uma questão interessante. Por que amamos as pessoas que amamos? Embora não deseje de modo algum insultar minha esposa, a resposta para mim e, a menos que eu erre meu palpite, a resposta para muitos de nós é , “eu não sei!” Nós amamos. Ah, posso falar sobre seu ser gracioso, inteligente, divertido, encantador e assim por diante. Mas a linha básica é, eu apenas amo. Eu não sei por que a amo. Eu apenas amo. Tem a ver com quem eu sou e com quem ela é, e como combinamos. Portanto, eu tomo estas coisas como indícios daquele que me fez “quem eu sou” para o que eu devo fazer. O Espírito deve iluminar nossas circunstâncias. Ele deve ajudar-nos a interpretar os fatores criacional e providencial. Mas quando tomamos os dons, oportunidade e interesses que ele nos tem dado e os usamos para sua glória, o agradamos. Quando o Dr. Werner von Braun construiu o foguete lunar Saturno 5 e ele decolou e cumpriu sua tarefa perfeitamente, ele glorificou o Dr. Von Braun. Mais do que isso, ele glorificou o Deus, que fez o homem, que fez o foguete Saturno 5. Assim é com todos os nossos dons. Quando os usamos, glorificamos o Deus que os deu. Sabemos o que ele quer pelo que ele tem feito. Aquilo para o que ele nos criou, é o que devemos procurar ser.

Há também uma liberdade no Cristianismo que acaba dizendo, como Agostinho fez. “Confie em Deus e faça o que você quiser” . Não somos cativos de uma “terceira” vontade de Deus, oculta. Temos a verdadeira liberdade para fazer o que queremos fazer, porque o que queremos (quando estamos andando com Cristo) foi determinado pelo que Deus nos fez ser . Por alguns anos, eu presumi que, se eu quisesse algo, Deus não o desejaria para mim. Eu presumia que a criação e a redenção eram estranhas uma a outra. Meus desejos naturais, eu supunha, eram carnais e inválidos. Esta pode ser uma perspectiva muito prejudicial e opressiva sobre a vida, sufocando os desejos naturais dados por Deus. Somos livres em Cristo para ser tudo que queremos ser. Certamente esta aproximação está aberta a abuso. É fácil procurar nossa própria vontade em nome da vontade de Deus. Mas quando estamos procurando a orientação do Espírito através da Palavra, da oração e de conselhos piedosos, encontraremos nossos desejos convergindo com os dele. O que queremos, somos ajudados a conhecer, é o que ele quer. Harmonia é a nova ênfase. O que ele nos salvou para sermos, revela ser a mesma coisa que ele nos criou para sermos. Somos libertos em Cristo para nos tornarmos tudo o que ele nos fez para ser.

A fé cristã é belamente holística. Ela não limita nossos esforços às coisas “espirituais”. Ela não limita o envolvimento de Deus a coisas sobrenaturais. Todas as coisas cooperam para o bem do povo de Deus. Ele nos orienta através da totalidade de sua obra, sua Palavra, seu mundo, com seu Espírito conduzindo e iluminando-nos a cada passo do caminho, até chegarmos ao lugar onde nos tornamos certos de que o próximo passo é tomado em sua sabedoria. Este senso de dever nunca é infalível. Nos equivocamos, mas é possível alcançar um alto grau de certeza de que, quando vemos nossa criação, providência e redenção convergirem, realmente estamos caminhando nos “caminhos da justiça” , nos caminhos que ele escolheu para nós.

Fonte: Extraído de “A Doutrina da Graça na Vida Prática”, Terry Johnson, Ed. Cultura Cristã, 2001. São Paulo, SP. p.173-188.

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